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15 de abril de 2013

AO ILUSTRE SABIÁ DA CRÔNICA: RUBEM BRAGA


Ele literalmente viveu no "ar". Da infãncia docemente saboreada em Cachoeiro de Itapemirim fez da cobertura de Ipanema, no Rio de Janeiro, onde viveu de 1962 a 1990, ano de sua morte, o quintal de sua casa. Lá não faltaram plantas e passarinhos, uma de suas paixões. "Sou um homem do interior, tenho uma certa emoção do interior", dizia. A mostra que o homenagea não podia ser diferente. Tem o som dos pássaros que amava.
 
A exposição Rubem Braga - O Fazendeiro do Ar, que retrata a gradiosidade de um dos filhos mais respeitados das terras capixabas poderá ser apreciada, no período de 27 de março a 26 de maio de 2013, no Palácio Anchieta, no centro de Vitória. A mostra marca as atividades do centenário do cachoeirense que transformou a crônia em literatura, cultuada pelos mais importantes intelectuais brasileiros de sua época. Depois de Vitória, a exposição seguirá para São Paulo, Rio de Janeiro e para a Casa dos Braga, em Cachoeiro do Itapemirim.
 
Dividida em sete módulos temáticos, cada um dos espaços apresenta uma concepção visual diferenciada, de modo a provocar no espectador e ideia de imersão no universo ali retratado. Na sala Retratos, imagens do escritor, em diversas épocas de sua vida revelam a transformação do menino ao homem Rubem Braga. No espaço Cachoeiro: Capital Secreta do Mundo encontram-se expostas dez caixas suspensas, que ao serem abertas revelam textos, documentos e fotos.  As imagens surgem espelhadas, possibilitando que o visitante adentre na vida do cronista. "Meu pai foi durante algum tempo sitiante, minha mãe era filha de fazendeiro, meus tios eram todos da lavoura... Mas que brasileiro não é mais ou menos assim, não guarda alguma coisa da roça e não tem a melancólica fantasia de vez em quando voltar?", escreveu em 1960.
 
 
Na Sala de Redação, reproduções de páginas de jornal cobrem as paredes e o chão e, mesas típicas das existentes nos jornais da época trazem uma série de  seus textos. Ali o visitante é convidado a interagir a partir dos iPads acoplados a antigas máquinas de escrever como se fossem folhas de papel. É possível ouvir o som das máquinas que faziam parte do universo de jornalistas nas inúmeras redações espalhadas pelo país. As mesas temáticas mostram as várias facetas de Braga - diplomata, editor, escritor, repórter -, bem como seus interesses - artes, viagens, televisão. Algumas de suas crônicas são disponibilizadas aos visitantes, como por exemplo, Recado de Primavera, redigida em setembro de 1980:
 
"Meu caro Vinícius de Moraes, escrevo-lhe aqui de Ipanema para lhe dar uma notícia grave: A Primavera chegou. Você partiu antes. É a primeira Primavera de 1913 para cá, sem a sua participação. Seu nome virou placa de rua; e nessa rua, que tem seu nome na placa, vi ontem três garotas de Ipanema que usavam minisssaias. Parece que a moda voltou nesta Primavera - acho que você aprovaria. O mar anda virado; houve uma Lestada muito forte, depois veio um Sudoeste com chuva e frio. E daqui da minha casa vejo uma vaga de espuma galgar o costão sul da Ilha de Palmas. São violências primaveris. O sinal mais humilde da chegada da Primavera vi aqui junto da minha varanda. Um tico-tico com uma folhinha seca de capim no bico. Ele está fazendo ninho numa touceira de samambaia, debaixo da pitangueira. Pouco depois vi que se aproximava, muito matreiro, um pássaro-preto, desses que chamavam de chopim. Não trazia nada no bico; vinha apenas fiscalizar, saber se o outro já havia arrumado o ninho para ele por seus ovos. Isto é uma história antiga tão antiga que só podia acontecer lá no fundo da roça, talvez no tempo do Império. Pois está acontecendo aqui em Ipanema, em minha casa, poeta. Acontecendo como a Primavera. Estive em Blumenau, onda há moitas de azaléias e manacás em flor e, em cada mocinha loira, uma esperança de Vera Fischer. Agora, vou ao Maranhão, reino de Ferreira Fullar, cuja poesia você tanto amava, e que fez 50 anos. O tempo vai passando, poeta. Chega a Primavera nesta Ipanema, toda cheia de sua música e de seus versos. Eu ainda vou ficando um pouco por aqui - a vigiar, em seu nome, as ondas, os tico-ticos e as moças em flor. Adeus".
 
 
Percorrendo a exposição observa-se que no espaço Guerra estão expostos telefones antigos, típicos dos anos 1940, que ao serem tirados do gancho trazem músicas e trechos de programas de rádio e noticiários ouvidos na época da Segunda Guerra Mundial. Destaca-se a crônica Cristo Morto, redigida em 1945. Pendurados no teto, aviões de papel, feitos em origami compõem o ambiente. A sala visa lembrar as ações de Rubem Braga como correspondente de Guerra na Itália.
 
 
Na sala Passarinhos uma câmera capta a imagem do visitante, por meio de sua sombra e dos movimentos realizados com os braços, permitindo-o interagir com as projeções. "Entre um conde e um passarinho, prefiro um passarinho", escreveu em 1935. Nesse espaço o som que se ouve são de pássaros e há inúmeros deles, confeccionados em origami e pendurados no teto da sala. Em Musa há excertos de crônicas em que Braga mencionava as mulheres: "Já fui acusado de gostar de mulheres tristes. Não é verdade. Amo-as vivas e animais, distraídas como rolas e egoístas como gatos".
 
No último espaço, Cobertura reproduz-se a singularidade de seus prazeres.  Na cobertura em que morou em Ipanema, no Rio de Janeiro, Braga plantou um pomar e uma horta. Viveu cercado por sabiás e bem-te-vis. Recebeu amigos, intelectuais e boêmios. Sem sair da rede observava o oceano Atlântico logo adiante. A reprodução desse seu lugar traz vídeos com depoimentos de Fernanda Montenegro e Danuza Leão a respeito da essência do ser humano, Rubem Braga: "[...] cara de durão, com leveza de espírito", definiu Ziraldo.

SERVIÇO | Exposição Rubem Braga - O Fazendeiro do Ar
Curadoria: Joaquim Ferreira dos Santos
Visitação: Até o dia 26 de maio de 2013
Local: Palácio Anchieta | De terça e sexta-feira, das 8 às 18 horas. Sábados, domingos e feriados, das 9 às 17 horas. Entrada gratuita.

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